segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Um trabalho para bactérias

Engenheiro da USP estuda o aproveitamento da oxidação natural dometano por microrganismos em ‘biofiltro’. O gás é responsável por cerca de 15% do efeito estufa e grande parte de suas emissões vem do lixo de aterros sanitários.
Por: Yuri Hutflesz - Ciência Hoje On-line

O lixo é um problema quase sem fim. Mesmo quando depositado nos aterros sanitários mais modernos, os detritos continuam causando transtornos. Um deles é a liberação do gás metano (CH4), responsável por uma parcela relevante do efeito estufa. Pensando em reduzir essas emissões de forma simples e barata, o engenheiro civil Fernando Marinho, da Universidade de São Paulo (USP), trabalha no desenvolvimento de uma cobertura especial de solo, o ‘biofiltro’, que utiliza a ação de bactérias metanotróficas.
Nos locais em que o lixo comum é tratado de forma apropriada, o descarte ocorre em aterros sanitários de Resíduos Sólidos Urbanos. Esses terrenos, onde os dejetos ficam enterrados em camadas, são preparados para impedir a contaminação da água e do solo, além da proliferação de espécies nocivas. Apesar disso, não existe um método totalmente eficaz para a captura do metano, que resulta da ação de bactérias anaeróbias durante a decomposição do lixo orgânico.
“O que se faz atualmente é instalar um sistema de drenagem, direcionando o metano para a queima, que pode ou não gerar energia elétrica”, explica Marinho. No entanto, devido à compressibilidade dos resíduos e à pressão exercida pelo gás, parte do CH4 escapa para a atmosfera através de fissuras.
Bactérias que consomem metano são abundantes no ambiente. O que fazemos é apenas estimular sua multiplicação, dando a elas condições ambientais adequadas O ‘biofiltro’ proposto pelo engenheiro – uma camada de solo preparado para favorecer a proliferação da bactéria que consome metano – seria uma forma de contornar esse problema. “Esses organismos já são abundantes no ambiente”, afirma Marinho. “O que nós fazemos é apenas estimular sua multiplicação, dando a elas condições ambientais adequadas”, completa.
A aeração e a homogeneidade do solo também são importantes para a eficácia do biofiltro. Essas propriedades são necessárias para permitir a passagem e a distribuição uniforme do gás, de modo a impedir concentrações em pontos específicos.
A ideia é que a camada de solo com as bactérias seja colocada no encerramento das atividades do terreno, quando ele não comporta mais lixo. No caso dos aterros, o biofiltro ficaria sobre o último nível e não impediria o plantio de gramíneas, procedimento padrão para impedir a erosão.
Marinho também ressalta que, com esse sistema, até mesmo os lixões poderiam diminuir suas emissões, bastando cobrir a área onde estão os detritos.

Atualmente, o grupo coordenado pelo engenheiro realiza estudos no aterro Delta-1, em Campinas (SP). Apesar de a ideia de utilização das bactérias metanotróficas para conter o metano em depósitos de lixo não ser nova, ainda há poucas experiências práticas. “No exterior isso é mais comum, mas aqui apenas alguns pesquisadores desenvolvem estudos nesse sentido”, conta. Nessa linha, Marinho destaca iniciativas da Universidade Federal de Pernambuco, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e da  Universidade de Caxias do Sul.
Quantificar para vender As bactérias que consomem o metano liberam dióxido de carbono (CO2). Alguém poderia questionar, portanto, a pertinência da troca de um gás nocivo por outro. O fato é que o CH4 tem uma capacidade 21 vezes maior de reter calor.
Estima-se que o metano que escapa dos aterros corresponda a cerca de 20% do total de emissões desse gás por atividades humanas – responsáveis por 60% do CH4 que existe hoje na atmosfera.
Marinho trabalha no desenvolvimento de um método que ajude a calcular a quantidade de metano oxidada pelas bactérias Marinho trabalha ainda no desenvolvimento de um método que ajude a calcular a quantidade de CH4 oxidada pelas bactérias. Isso permitiria a venda de créditos de carbono no mercado internacional. O engenheiro garante que os gastos para a implementação e manutenção do biofiltro seriam muito baixos, mas um incentivo econômico com certeza tornaria os donos de aterros mais dispostos a adotar o sistema.
O principal obstáculo para se chegar ao cálculo está na dificuldade de saber a quantidade exata de metano que o lixo libera nas camadas mais profundas dos aterros, além das muitas variações que podem ocorrer por conta do clima e do regime de chuvas. Por isso, segundo Marinho, o método em desenvolvimento pretende trabalhar em cima da das estimativas mais pessimistas. “Queremos poder garantir que, na pior das hipóteses, determinada quantidade de metano foi oxidada”, conclui.

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